Nos rios Coporolo, Cavaco e Catumbela: Pessoas, animais, infra-estruturas, culturas…
Nos últimos 13 anos as populações das áreas ribeirinhas dos rios Coporolo, Cavaco e Catumbela vêm enfrentando cheias cíclicas acompanhadas de mortes de pessoas e animais, destruição de casas, vastas áreas cultivadas e outros prejuízos dos parcos recursos das populações.
As fortes chuvas, que caíram à montante dos rios Coporolo, Cavaco e Catumbela contribuíram para o aumento do caudal dos três rios causando consideráveis danos estruturais. Mais de 85 hectares de terras aráveis e diversas infra-estruturas foram destruídas no Dombe Grande, Vale do Cavaco e na Catumbela. Em alguns lugares dessas localidades, povoados inteiros foram inundados causando a deslocação dos seus habitantes para zonas mais seguras.
A caducidade em alguns casos, e a destruição em outros, dos sistemas de alerta rápido e outros sistemas de monitoria e instrumentos de previsão e medição do caudal dos rios, como os higrómetros instalados no período colonial em várias estações meteorológicas e a ausência ao longo de muitos anos de trabalhos de desassoreamento para regular o leito dos rios, faz com que as enchentes se repitam apanhando de surpresa as vulneráveis populações, incapazes de sozinhas ultrapassar os níveis de calamidade que o transbordo dos rios provoca.
A fúria da natureza ante a inércia humana
O Coporolo é tido como o mais problemático dos rios do litoral benguelense resultando em mortes, destruições e muito sofrimento da população. Dados disponíveis indicam que as cheias dos últimos anos desalojaram pelo menos seis mil e cem pessoas ao longo do rio com particular incidência das localidades de Luacho e Senje onde as enchentes destruíram os diques de protecção das duas margens do rio.
Abril de 2001, o manancial de água do rio Coporolo transbordou e arrasou tudo o que encontrou pelo caminho. A população da comuna do Dombe Grande estimada em 80 mil habitantes agita-se por completo devido ao facto. A inundação devastou lavouras e desalojou muitos populares na região.
Dados disponíveis indicam que o rio Cavaco, na periferia da cidade de Benguela, registou três grandes enchentes nos anos de 1979, 1983 e 2002, esta última considerada a mais severa, provocou o desabamento da ponte sobre o rio Cavaco já substituída em Março de 2005 por uma outra com características modernas. A enchente de 2002 destruiu também mais de 200 casas e 35 hectares de culturas diversas de populares nos bairros do Calomburaco, Cotel, Calomanga e Seta, nestes dois últimos, causou ainda a morte de duas pessoas.
O rio Catumbela, de regime permanente, na comuna com a mesma designação apresenta até aqui os índices de assoreamento mais baixos dos últimos tempos, não provocou grandes inundações ao contrário dos outros dois, mas a expansão natural do seu caudal devastou nos últimos oito anos 50 hectares de terras agricultáveis, afectando assim a produção agrícola local.
Depois da tempestade, a bonança
É verdade, como que a fazer jus à expressão segundo a qual “depois da tempestade vem a bonança”. As populações sofreram muito na carne os efeitos devastadores inundações e as autoridades governamentais aprenderam as lições depois de muitos apelos à navegação e finalmente planificaram os recursos necessários e lançaram mãos à obra para o desassoreamento dos três Cês: Cavaco, Coporolo e Catumbela.
As autoridades sustentam que as obras de desassoreamento dos rios Cavaco, Catumbela e Coporolo orçadas em 39 milhões de dólares americanos garantirão até aos próximos 40 anos, a segurança e tranquilidade das populações ribeirinhas contra eventuais cheias que eventualmente possam voltar a ocorrer.
As empreitadas de desassoreamento dos vales dos rios Cavaco na cidade de Benguela e Catumbela no Lobito, que abrange oito quilómetros de extensão do Coporolo na comuna do Dombe Grande constam do Programa de Regularização e Controlo dos Rios em toda a extensão da Província. As obras no Coporolo iniciadas em Outubro com término aprazado para Março de 2007 incidirão na sua margem esquerda.
Os trabalhos nos rios Cavaco e Catumbela vão garantir maior segurança na presente época chuvosa e em próximas, às comunidades locais, culturas e infra-estruturas diversas localizadas nas proximidades das margens dos rios evitando que as cheias que periodicamente as afectava se repitam.
Benefícios
Segundo o director provincial das Obras Públicas, Arquitecto Zacarias Camuenho, o desassoreamento dos três rios trará benefícios incalculáveis à vida da população, fundamentalmente do município de Benguela e comunas da Catumbela e Dombe Grande, tanto na protecção das suas áreas agrícolas para o fomento desta actividade, como das suas residências, construídas na sua maioria, de forma precária.
O arquitecto, que não revelou o número de populares já afectados pelas enchentes locais até ao momento, disse que cada um dos rios apresenta características singulares de inundações, sendo o Coporolo, aquele que mais danos tem causado à vida das pessoas.
Na opinião do director provincial da Agricultura e Desenvolvimento Rural, Abrantes Sequesseke, há multo que a província clamava pelo desassoreamento dos rios por causa dos constrangimentos de vária ordem que provocavam à vida da população. “Os trabalhos de desassoreamento desses rios são na verdade oportunos, para minorar os problemas tanto sociais quanto produtivos da população benguelense” – frisou Sequesseke.
Abrantes Sekesseke considera o desassoreamento dos rios locais como um passo bastante importante dado pelo Governo aos níveis central e local, de modo a permitir também e, sem sombras de dúvidas, o relançamento da agricultura nas áreas do Cavaco, Catumbela e Coporolo e não só, afectadas pela problemática das últimas inundações.
A voz do povo
Para Fabião Domingos João, soba adjunto dos bairros Cotel, Massangarala e Tchioche ribeirinhos ao rio Cavaco, o desassoreamento é bem-vindo, tendo em conta que vai permitir a protecção das casas e culturas diversas dos populares, que antes se debatiam com inundações permanentes. “Neste momento é visível a satisfação das comunidades locais, devido a execução com celeridade dos trabalhos de desassoreamento do rio Cavaco”, acrescentou aquela autoridade tradicional.
Os populares dos bairros do Calomburaco, Cotel, Calomanga e Massangarala, nas margens do rio Cavaco, consideram que o estado crítico e assoreado do leito deste rio constituiu sempre uma preocupação premente, devido as inundações que causavam inúmeros prejuízos materiais e humanos.
Gaspar de Oliveira Pereira, morador no Calomburaco desde 1968, diz-se satisfeito pelo trabalho, que vai permitir que o leito do rio esteja regularizado, de modo a que as enchentes que se vinham registando não destruam mais nem culturas nem residências das pessoas já de si empobrecidas.
Para ele há muito que o leito do Cavaco, por ser um rio seco, serve de depósito de lixo, sendo então oportuno que o projecto de desassoreamento contemple também a construção de balneários e lavandarias públicas, para contribuir na educação da população e compreender a necessidade de preservar o meio ambiente.
Aponta como outro benefício, o facto do “desassoreamento” vir a permitir os agricultores locais retomarem as suas actividades, frisando que nas margens deste rio se produz essencialmente hortícolas, frutas e tubérculos.
César Armando, que vive no Calomburaco há seis anos, manifesta-se igualmente satisfeito com o desassoreamento do rio Cavaco, cujos trabalhos em seu entender decorrem a bom ritmo, o que motiva a população a sentir-se agora muito mais segura para enfrentar as chuvas.
“Pelos níveis positivos visíveis nos trabalhos, neste momento já se devolveu a segurança e o sossego à população ribeirinha”, sublinhou, ao mesmo tempo que lembrou o fatídico Domingo de Páscoa em Abril de 2002, quando as águas do rio Cavaco galgaram até às margens, a sua casa foi destruída, tendo levado mais de um ano para reconstrui-la, em meio a muitas dificuldades.
Outra interlocutora, Cristina Kandimba, 85 anos de idade, residente no Cotel há 55 anos. Para ela, a população sente uma profunda satisfação pelo trabalho que está a ser conduzido pelo Governo. Os receios e o sentido de resignação que antes marcaram o seu quotidiano já ficaram para trás, o desassoreamento do rio, agora há mais força e vontade de trabalhar, isso ajuda a província a avançar.
“Depois das chuvas torrenciais de 2002, terem feito o rio Cavaco transbordar, as pessoas ficaram muito aflitas sem saber o que fazer, porque as nossas próprias casas foram atingidas e arrastadas pela força das águas. Perdemos os nossos poucos recursos, mas tudo isso já passou”, ironiza Cristina Kandimba, ao mesmo tempo que reconhece que são imprescindíveis as obras de desassoreamento dos três rios Cavaco, Catumbela e Coporolo, apelando por isso a população a contribuir para a sua materialização exitosa desta empreitada.
Prevenir é melhor que remediar
Além do desassoreamento dos três rios em curso, as autoridades locais dão-se conta de que precisam igualmente implementar outras medidas para prevenir eventuais secas com a construção nos próximos tempos, de três estações hidrométricas em Benguela, para monitorar o sistema de alerta rápido das chuvas na região.
Os empreendimentos cujos orçamentos rondam um milhão de dólares americanos serão financiados pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) e o Inarate uma instituição da Noruega ligada aos serviços de protecção civil.
Outro benefício directo do projecto de desassoreamento dos rios Catumbela, Cavaco e Coporolo tem a ver com a criação de quinhentos novos postos de trabalho, um contributo para diminuição dos elevados índices de desemprego.
O curso dos trabalhos
As obras, adjudicadas em Outubro de 2005 à empreiteira brasileira Odebrecht em parceria com a Pavitera têm um cronograma de execução de 18 meses, em duas fases: a primeira contempla a construção de diques de protecção nestes rios e a feitura de aterros na ordem dos 834 mil metros cúbicos para regularizar os seus caudais.
A etapa complementar será reservada às obras de carácter definitivo, contemplando as infra-estruturas hidroeléctricas, económicas e sociais ao seu redor, com realce para a açucareira do Dombe Grande, no caso particular do rio Coporolo. As obras do projecto de desassoreamento dos três rios, fiscalizadas pela firma libanesa Dar-al-handasah, compreendem uma bacia hidrográfica na ordem dos 38 mil metros quadrados.
O rio Catumbela será desassoreado numa extensão de 17 mil e 500 metros quadrados, o Coporolo em 16 mil metros quadrados e o Cavaco em quatro mil e 500 metros quadrados, neste último, o Governo local prevê certas acções para complementar na execução das suas obras, numa perspectiva da construção de uma nova Avenida que se ligará a marginal da praia Morena ao longo do rio, facto que constitui um marco memorável no capítulo das obras públicas locais.
Foi já concluída a primeira fase de desassoreamento do Cavaco com a execução na sua margem esquerda de cinco quilómetros de aterro com cerca de três metros de altura, ao passo que na margem direita foram construídos três quilómetros de aterro com dois metros de altura, de forma a regular o leito do rio.
Nas obras no rio Cavaco, que prevêem a feitura de diques de protecção de quatro metros de altura e igual número de largura, numa extensão de 12 quilómetros de aterro, trabalham 85 pessoas, dos quais dois brasileiros. No que toca a meios, movimentam oito camiões basculantes, duas moto-niveladoras, um buldozer, uma retro-escavadora e uma relo-compactadora, além de dois camiões cisternas.
No respeitante ao rio Catumbela, onde a edificação de diques abrange apenas três quilómetros da margem direita houve uma alteração para a melhoria do projecto inicial, que se baseia na construção do dique e de uma via de acesso com quatro metros de largura.
Nesta empreitada foi incluído um outro projecto para a construção de uma marginal que terá uma extensão de 50 metros e nela serão feitos loteamentos para residências e uma área de lazer, adjacente ao actual zoológico, uma forma de permitir o fomento da actividade turística na Catumbela.
No local, serão ainda construídas lavandarias públicas e um balneário, acções que estão a ser aplaudidas pelas comunidades ribeirinhas, pelo facto de trazer mudança sociais como a tradicional lavagem de roupa nas margens do rio.
Pensar global e agir local
As cheias são, em qualquer parte um dilema, como provam estes casos. A África Austral, região da qual Angola faz parte, foi assolada por cheias, que resultaram na destruição de infra-estruturas e habitações. De Dezembro de 2005 a Março de 2006 na vizinha província da Huila, pelo menos 45 casas foram destruídas. Além fronteiras, em Moçambique, pelo menos 22 pessoas morreram e mil e 500 famílias desalojadas totalizando cerca de nove mil pessoas afectadas. Na província de Sofala, aproximadamente quatro mil hectares de milho foram destruídos.
Notícias do Malawi, indicaram que 72 hectares de terras aráveis foram danificados e mais de duas mil pessoas ficaram desalojadas no distrito de Nsanje. Isto foi depois das chuvas pesadas terem feito com que o Rio Ruo galgasse as margens, afectando cerca de 40 mil pessoas. Enquanto isso, na Zâmbia, as inundações estragaram fontes de energia depois da destruição da principal estação de energia hidroeléctrica em Kafue Gorge.
Todos os Estados membros da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC), incluindo os que partilham a bacia do Zambeze, acederam à Convenção da Estrutura das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC). Esta, os impele a regular a emissão do gases na atmosfera para evitar a ocorrência da mudança do clima, visto que impede o desenvolvimento económico e sustentável, ou compromete iniciativas de produção alimentar.
Um impulso ao fomento agrícola e turístico
Os trabalhos de desassoreamento e regularização dos caudais dos rios Cavaco, Catumbela e Coporolo, constituem um incentivo indispensável no seio dos camponeses do litoral benguelense, para o relançamento da actividade agricultura, como factor essencial para o aumento considerável da segurança alimentar na região.
De acordo com o director provincial de Benguela da Agricultura e Desenvolvimento Rural, Abrantes Sequesseke, os rios Coporolo, Cavaco e Catumbela, contêm bacias hidrográficas úteis ao fomento da actividade agrícola, por isso o seu desassoreamento proporcionará bons rendimentos aos agricultores, visando desenvolver a economia dessas localidades.
O responsável pela agricultura na província afirma que, após a província ter perdido nos últimos oito anos mais de 85 hectares de terras aráveis, em consequência das inundações provocadas pelas enchentes dos rios, é pois chegado o momento adequado para se investir no sector agrícola, mormente nas localidades mais afectadas pela crise.
O entrevistado revela que, só nas margens do rio Cavaco, foram destruídas aproximadamente 35 hectares de terras aráveis e 50 na Catumbela, por causa das fortes águas torrenciais resultantes do transbordo dessas correntes fluviais, mas em relação ao Coporolo não precisou os dados.
Sekesseque disse que por via do desassoreamento dos rios, o governo cria, naturalmente, benefícios para se relançar e aumentar a actividade agrícola produtiva na província de Benguela, já que os agricultores deixarão de perder mais áreas aráveis.
O agricultor comenta
Para o agricultor Gaspar Pereira, morador no bairro Calomburaco há 44 anos, depois de regularizado o caudal do rio, será possível aos camponeses a prática contínua da agricultura com mais tranquilidade e confiança. “Os agricultores, principalmente das proximidades das margens do rio Cavaco pensam já no reinício das suas actividades agrícolas que são fundamentais por que garantem a subsistência alimentar das suas comunidades”, sustentou
Cristina Kandimba, camponesa de 85 anos de idade, residente no Cotel há 55 anos, disse por sua vez, que a população sente uma profunda satisfação pelo trabalho que está a ser feito, por que isso vai potenciar a actividade agrícola e dar mais sossego à população.
“O desassoreamento do rio Cavaco, virá estimular muito a participação e empenho dos agricultores na revitalização do sector agrícola, para que as dificuldades sociais e económicas que a população padece sejam minimizadas”, assegurou.
A capacidade produtiva do Vale
No Cavaco, segundo dados, existiam no período colonial 700 hectares de bananais diversos, cuja produção se estimava em perto de 25 mil toneladas da banana destinadas à exportação, servindo entre vários países, a Portugal, Áustria, Suiça, Alemanha, Dinamarca. Tudo isso, graças a estabilidade que reinava e das estruturas implantadas para o apoio técnico-científico.
Actualmente o nível de produção deste produto reduziu drasticamente, devido por um lado ao conflito armado que assolou no país, que fizera com que os agricultores estivessem incertos à produção e por outro, ao fraco apoio técnico-material a que os mesmos estavam votados neste período.
Com o actual ambiente de paz, o Governo de Benguela tem estado a criar condições favoráveis para impulsionar os investidores estrangeiros, a contribuírem para o relançamento do sector agrícola no município sede da província e de um modo geral em toda região.
A Catumbela dispõe de inigualáveis belezas tropicais, como o parque dos Bambus, as palmeirinhas e o próprio majestoso curso hídrico que serpenteia dentre montanhas. Estas potencialidades turísticas serão, por via do desassoreamento do rio, aproveitadas inteligentemente. Em face a isso, numerosos turistas ávidos de conhecer o país e esta região, em particular, têm mantido contactos com as autoridades e empresários locais, de modo a lançar bases para o fomento do sector.
Por: José Honório